Esquecer Eu Quisera
Esquecer eu quisera
Ah quem me dera
Minha mente alucinada vibra gira
Entorta minha cabeça
Mas sempre diz sim às lembranças
Que não esqueço!
Esquecer eu quisera
Da responsabilidade da vida
Que me engole aos pedaços
Sem mastigar minha carne
Sem sentir meu gosto!
Esquecer eu quisera
Das décadas todas da minha vida
Onde presenciei uma guerra traiçoeira
Através de filmes jornais
E revistas sem censura!
Bombas explodindo sem aviso destroçando
O que encontravam à sua frente
Bombas despencando
Sobre cabeças adormecidas
Antes mesmo do alvorecer de cada dia!
Esquecer eu quisera
E não mais lembrar do medo que eu sentia
Sem saber se era verdade ou mentira
O que eu via e ouvia!
O pavor tomava conta do meu corpo de criança
Encolhido em minha cama onde meus olhos choravam
Não havia entreatos
Os soldados jamais voltavam ao levantar do pano
Para o início do segundo ato!
Ficavam ali tombados expostos às moscas
Vermes e abutres esfaimados
Onde os deuses ensandecidos e toda sua maldade?
Nunca soube que em sua sanha
Houvessem deuses compadecidos
Ao assistir o sofrimento do povo
Compaixão não existia por qualquer alma
Por alma nenhuma nem por nada!
Esquecer eu quisera
E não lembrar mais dos fogos da minha infância
Fogos daninhos que me assustavam
Faziam-me tremer de pavor
Porque a queima de fogos apresentados
Nunca passaram de bombas canhões
Rajadas de metralhadoras aviões explodindo
Pára-quedas no ar incendiando!
Esquecer eu quisera
E poder apagar da lembrança a visão de soldados
Desacompanhados de suas damas
Dançando uma valsa desconexa nos campos de batalha
Rodopiando até à morte!
Esquecer eu quisera...
De donzelas graciosas que existiram sim
Mesmo que por pouco tempo
Vítimas inocentes violentadas e mortas
Por seres dementes e diabólicos!
Esquecer eu quisera
Dos rapazes que nasceram sim
Mas os governos em seus extremos
Os tornaram adultos de pouca idade!
Seguiam aos campos de batalha
Com passagens pagas
Partiam com pouca bagagem
Sem o bilhete de volta!
Esquecer eu quisera
Que eu não andava por ruas e ruas
Eu não andava por rua nenhuma
Pelo pavor que os bombardeios me causavam
E o barulho imaginário das bombas
Explodindo em meu quintal avermelhado
Refletindo a cor das chamas!
Eu não escrevia frases nem frases
Eu sabia escrever mas não escrevia nada
Apenas orava e orava
Para que Deus fizesse calar o ruído das armas
Que martelavam meu cérebro e ouvidos
Pondo-me em estado de alerta
Ao imaginar bandeiras esgarçadas
Hastes cravadas ao solo pelas mãos de soldados
Ao se apossarem de novas terras ensangüentadas!
Naquela época o relógio do tempo era calmo
Não gritava não dava ordens nada demarcava
Para ele pouco importava o fim ou o começo de nada!
Ah se eu entendesse de profecias quando criança
E soubesse que o instante é fixo não duradouro
Talvez eu não tivesse sofrido tanto!
Ah quisera ainda lembrar das santas que cultivavam rosas
E de suas imagens cristalizadas
Ocultas em algum canto de minha memória!
Onde o mundo o povo sem vida
Enterrando seus mortos
Como seria bom serem eternos os pensamentos
Que nos fizessem reviver somente momentos mágicos!
Esquecer eu quisera...
Mas como
Se ainda me lembro o quanto doeu e dói
O terror do holocausto
Da guerra maldita que me volta à memória
Ou em pesadelos reaviva meus medos
Fazendo rolar novamente
Cada lágrima chorada dos meus olhos!
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