segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

AS MULHERES DA MINHA GERAÇÃO

Hoje têm quarenta e muitos anos, inclusive cinquenta e tal, e são belas,
muito belas, porém também serenas, compreensivas, sensatas e sobretudo
diabolicamente sedutoras, isto, apesar dos seus incipientes pés-de-galinha
ou desta afectuosa celulite que capitoneam as suas coxas, mas que as fazem tão humanas, tão reais.

Formosamente reais. Quase todas, hoje, estão casadas ou divorciadas, ou
divorciadas e casadas, com a intenção de não se equivocar no segundo
intento, que às vezes é um modo de acercar-se do terceiro e do quarto
intento. Que importa?

Outras, ainda que poucas, mantêm um pertinaz celibatarismo, protegendo-o como uma fortaleza sitiada que, de qualquer modo, de vez em quando abre as suas portas a algum visitante.

Que belas são, por Deus, as mulheres da minha geração!

Nascidas sob a era de Aquário, com influência da música dos Beatles, de Bob Dylan, de Lou Reed, do melhor cinema de Kubrick e do início do boom
latino-americano, são seres excepcionais.

Herdeiras da revolução sexual da década de 60 e das correntes feministas,
elas souberam combinar liberdade com coqueteria, emancipação com paixão, reivindicação com sedução.
Jamais viram no homem um inimigo, apesar de lhe cantarem algumas verdades, pois compreenderam que a sua emancipação era algo mais do que pôr o homem a
lavar a louça ou a trocar o rolo do papel higiénico quando este
tragicamente se acaba.

São maravilhosas e têm estilo, mesmo quando nos fazem sofrer, quando nos enganam ou nos deixam.

Usaram saias indianas aos 18 anos, enfeitaram-se com colares andinos,
cobriram-se com suéteres de lã e perderam a sua parecença com Maria, a
Virgem, numa noite de sexta-feira ou de sábado, depois de dançar El Raton
com algum amigo que lhes falou de Kafka, de Neruda e do cinema de Bergman.

No fundo das suas mochilas traziam pacotes de rouge, livros de Simone de
Beauvoir e fitas de Victor Jara, e, ao deixar-nos, quando não havia mais
remédio senão deixar-nos, dedicavam-nos aquela canção, que é ao mesmo tempo um clássico do jornalismo e do despeito, que se chama "Teu amor é um jornal de ontem".

Falaram com paixão de política e quiseram mudar o mundo, beberam rum cubano e aprenderam de cor as canções de Sílvio Rodriguez e de Pablo Milanez, conhecerem os sítios arqueológicos, foram com seus namorados às praias, dormindo em barracas e deixando-se picar pelos mosquitos, porque adoravam a liberdade e, sobretudo, juraram amar-nos por toda a vida, algo que sem dúvida fizeram e que hoje continuam a fazer na sua formosa e sedutora madureza.

Souberam ser, apesar de sua beleza, rainhas bem educadas, pouco caprichosas ou egoístas. Deusas com sangue humano. O tipo de mulher que, quando lhe abrem a porta do carro para que suba, se inclina sobre o assento e, por sua vez, abre a do seu companheiro por dentro.
A que recebe um amigo que sofre às quatro da manhã, ainda que seja seu
ex-noivo, porque são maravilhosas e têm estilo, ainda que nos façam sofrer,
quando nos enganam, ou nos deixam, pois o seu sangue não é suficientemente gelado para não nos escutar nessa salvadora e última noite, na qual estão dispostas a servir-nos o oitavo uísque e a colocar, pela sexta vez, aquela melodia de Santana.

Por isso, para os que nascemos entre as décadas de 40 e 60, o dia da mulher é, na verdade, todos os dias do ano, cada um dos dias com suas noites e seus amanheceres, que são mais belos, como diz o bolero, "quando está você".
Que belas são, por Deus, as mulheres da minha geração!