segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

Deixem-me Sonhar!

Deixe que as flores simples e delicadas, e o mato verdinho
cheguem bem na porta do ''meu cantinho de sonhar'',
na grande cidade onde vim morar.

Deixe entrar os passarinhos na cozinha para comerem as sobras
que deixo no chão, para que eles saltitando e bicando, venham limpar...
São pardais e rolinhas, avezinhas que muitos odeiam porque sujam
os quintais cobertos de ardósia encerada.
Porque defecam na área da piscina... Ou dormem nos beirais
deixando as paredes de fezes manchadas.
Mas com o passar dos anos, nem rolinhas nem pardais
nosso lar rodearão...
Restará só pó de asfalto, minério e muita poluição!

Deixe-me sentir que anda vivo no mesmo lugar
onde junto à natureza cresci
e para a dureza da vida, amadureci.
...

Acordava ao som da passarada em algazarra...
Com os bezerros mugindo famintos para mamar
nas tetas transbordantes de leite, até a boca espumar!
E no galinheiro, a galinhada no seu cacarejar,
esperava a abertura da portinhola, para no quintal,
seu alimento fresco e natural, caçar.

E o vaqueiro depois da ordenha,
com os latões de leite quentinho e espumante,
despejava-o num grande latão, para nele ainda morno,
misturar ao coalho, e em repouso fermentar...
Para o sabororoso ''queijo do Serro'' fazer,
e na bancada de madeira, maturar.

O soro que da queijeira escorria, era colhido e misturado
ao farelo do milho para alimentar os porcos
que famintos, grunhiam impacientes no chiqueiro.

E eu encolhida e agasalhada, tinha as pernas roxas e de frio, rajadas...
Mas da varanda ficava a observar tudo que via, encantada!
Nem imaginava a que horas a lida ali começava.
Só sei que o dia ainda estava escuro...
O trabalho nas fazendas e sítios é duro!
Não têm fim-de-semana, feriado nacional nem dia Santo.
Ai se tivesse! Ouviria só có-có-ri-cós, mugidos e grunhidos...
O que para a sensibilidade desta menina poetisa,
veria com espanto.

Ah, deixa eu sonhar com os sons d'onde nasci.
Esquecer este amanhecer e adormecer barulhento
com disparos dos alarmes nas garagens e portões...
O buzinaços nas ruas, avenidas e estacionamentos...
E este ar quase irrespirável de gases fétidos e toxinas.
É um tormento! E se ligar a tv, só se noticia bala perdida,
roubalheira e chacina.

Ah, quanta saudade tenho do lugar onde nasci
e das cidades onde estudei e vivi.
Esta saudade que por vezes me invade e me angustia,
só tem um jeito de amenizá-la:
É voltar no tempo... E registrar tudo na poesia.