terça-feira, 20 de fevereiro de 2007

Poema do alegre desespero

Compreende-se que lá para o ano três mil e tal ninguém se lembre de certo Fernão barbudo
que plantava couves em Oliveira do Hospital,ou da minha virtuosa tia-avó Maria das Dores
que tirou um retrato toda vestida de veludo sentada num canapé junto de um vaso com flores.
Compreende-se.
E até mesmo que já ninguém se lembre que houve três impérios no Egipto(o Alto Império, o Médio Império e o Baixo Império)com muitos faraós, todos a caminharem de lado e a fazerem tudo de perfil,e o Estrabão, o Artaxerpes, e o Xenofonte, e o Heraclito,e o desfiladeiro das Termópilas, e a mulher do Péricles, e a retirada dos dez mil,e os reis de barbas encaracoladas que eram senhores de muitas terras,que conquistavam o Lácio e perdiam o Épiro, e conquistavam o Épiro e perdiam o Lácio,e passavam a vida inteira a fazer guerras,e quando batiam com o pé no chão faziam tremer todo o palácio,e o resto tudo por aí fora,e a Guerra dos Cem Anos,e a Invencível Armada,e as campanhas de Napoleão,e a bomba de hidrogénio,e os poemas de António Gedeão.
Compreende-se.
Mais império menos império,mais faraó menos faraó,será tudo um vastíssimo cemitério,cacos, cinzas e pó.
Compreende-se.
Lá para o ano três mil e tal.E o nosso sofrimento para que serviu afinal?