quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Primavera......

Naquela manhã, a Primavera chegara, vestida de luz, de cores e
de alegria, entornando perfumes sutis, desabrochando as flores e
vestindo as árvores de roupagens verdes.

Era, no entanto, um espetáculo grandioso, onde brotavam flores
radiosas e o canto dos pássaros enriquecia o abrir da minha janela.

Naquele momento, levantei de um sonho e por instantes não temi acordar.

No entanto, ao colocar os meus pés naquele chão frio gelei até
ao íntimo da minha alma, e nesse estranho momento cheio de ritos e
ternura saudei a realidade.

Naquele dia, assim como todos os outros, peguei num pacote que
envolvia um número de jornais e, corri o mais que pude, entre flores
perfumadas até a rua principal que nos levava a praça.

Como sempre chegara no momento certo, a minha presença
despertava a vida na cidade; as portas se abriam, as janelas também, e
as crianças corriam para as escolas.

Naquele dia, as pessoas não carregavam consigo aquele olhar
pesado, aquele andar tão rápido que nem as deixava sentir, aquele
silêncio que dizia muito, e calava muitos outros, tudo, mas tudo
estava certo, nesse momento, nesse dia...

No final da tarde, quando as pessoas regressavam as suas casas
e as suas famílias, eu subia a rua principal, com os meus pés
pequeninos, e levando comigo a sujidade da cidade e o suor do meu
cansaço, ansiava por chegar a aquele "ermo" a quem eu calorosamente
chamava de casa.

Trazia comigo a alegria de ter vendido todos os jornais, e um
pedaço de pão que a mulher do padeiro me dera em troca de serviços.

Era a única refeição que tinha, mas era o bastante para me
sentir farto e saciado.

No final do dia, antes de me deitar debrucei-me sobre a janela,
e agradeci a mãe natureza pelo calor que me agasalhava, pelas flores
que me faziam companhia, e pelo sol e a lua que eram a minha luz de
cada dia.

E, subitamente quando já não esperara ninguém recebo a presença
de um pássaro branco cujo o nome não sabia, e nunca soube.

Este, olhava para mim, e inclinando o seu frágil pescoço para
a esquerda, e para a direita fitava os seus olhos nos meus, somente no
ato da minha entrega ao mundo da fantasia, este deixava-se voar.

Nesse momento, fechei os olhos e desejei viver aquele momento
todos os dias da minha existência.

E assim o foi, em todas as primaveras e em todas as noites.

Aquela presença fez brotar em mim o sentido de sonhar, crescer,
lutar, viver, querer...

E foi essa presença que fez de mim um escritor...

Comecei a escrever, coloquei todos os meus gritos de liberdade,
os meus medos e desejos de igualdade... no papel.