quarta-feira, 21 de outubro de 2009

A BÊNÇÃO DAS LÁGRIMAS

Bendita a lágrima em que se cristaliza o acervo atroz de nossas
dores e se dilui o negro fel de nossas mágoas.

Bendita a lágrima a cuja tona flutuam farrapos sombrios de
sonhos dourados e em cujo fundo vagueiam espectros tristonhos de
esperanças mortas.

Bendita a lágrima dos que carpem a desdita de nascerem sem teto
e choram a desgraça de viverem sem pão.

Bendita a lágrima dos que jamais conheceram um afeto de mãe e
nunca provaram um carinho de esposa.

Bendita a lágrima desafogo amigo dos que são sós e consolo
ardente dos que são tristes.

Bendita a lágrima dos que põem sobre os ombros a cruz de seu
próximo e o ajudam a escalar o calvário da existência.

Bendita a lágrima dos que buscam, errantes, o calor de um afeto
e somente encontram o frio do desprezo.

Bendita a lágrima dos que sofrem injustiças pelos ideais que
defendem e só colhem ingratidões pelo bem que semeiam.

Bendita a lágrima que erige no cérebro um templo à Verdade e
converte o coração num sacrário de Amor.

Bendita a lágrima que aflora, escaldante, nas noites do
sofrimento e esplende como um sol nas manhãs da redenção.

Bendita, enfim, a lágrima gota de luz das auroras celestes e
síntese terrena do orvalho divino.