AMA SEMPRE
Contemplando o Anjo da Morte, a alma arrimada ao leito despedia-se enfim...
Quisera comentar as sensações derradeiras para os entes amados, no entanto, contraira-se-lhe a boca em amargo silêncio.
Tentava estender as mãos ansiosas e amigas aos que ficavam, contudo, enrijeciam-se-lhe os braços como se imobilizados em couraça de gelo.
Queria continuar a ver-se nas molhadas pupilas que se rodeavam, tristes, mas o pranto a cair-lhe dos olhos encovados suprimia-lhe, aos poucos, a bênção de visão.
Era a grande viagem dentro do nevoeiro...
Sob o enorme conflito a vergar-lhe a esperança, recorreu à oração e o pensamento reto recusou-se a atender.
Ainda assim, apelou para a memória, demandando recursos improvisados que lhe pudessem doar segurança e consolo.
Recordava, com intensa aflição, todos os lances da própria vida.
Sofrem, sim, mas fizera com que outros sofressem...
Lutara imensamente, reparando, porém, corações desditosos em combate maior...
E enquanto meditava, no turbilhão de angústias, mergulhou-se-lhe a mente em dolorosa noite.
Todavia, das trevas, eis que pontos de luz descerram-se, cantantes, pequeninas estrelas a lucilarem, lindas, dentro da névoa espessa.
Chegam em revoada, quais sorrisos de amor desvelando na Altura, a estrada para os céus.
Atordoada e enlevada, a alma enxerga, de novo, o Anjo que a consola, explicando, amoroso:
- Eleva-te mais alto! Estes pingos de sol revelam-te o caminho! São eles, todos eles não são as gotas de fel que choraste entre homens, mas, sim, as que secaram, espalhando a alegria...
Foi assim que sem mágoa, a alma feliz, então, avançou para os cimos, ante as cintilações da caridade pura, que transformara em pérolas de esplendente beleza as lágrimas de dor que ela própria enxugara entre as sombras do mundo...
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