terça-feira, 19 de outubro de 2010

Setenta vezes Sete

Há pessoas que levam muito a sério as palavras de Jesus quando disse que devemos perdoar até setenta vezes sete; umas por que sentem-se mártires e acham que tudo deve ser aceito e outras por que, do outro lado, beneficiam do assunto. Só que Jesus disse também à mulher: "nem Eu te condeno. Vá e não peques mais." Ele poderia simplesmente tê-la deixado partir, mas pediu que não repetisse o erro.

Não há nenhuma idéia contrária no tema. O perdão, devemos carregar em nós até porque ora precisamos, ora oferecemos. Os que nos amam perdoam nossas falhas e nós passamos uma borracha por cima de muito do que nos magoa nos que amamos. Segue assim a vida.

E, portanto, há situações que tornam-se repetitivas no "eu erro e você me perdoa." Aquele que erra com o tempo acostuma-se com a situação, pois até o sentimento de culpa acaba por encontrar um lugar e ficar quietinho. E o que perdoa sempre e sempre as mesmas coisas perde com o tempo o respeito por si mesmo.

Aceitar situações que aniquilam nossa dignidade humana não nos torna mais humildes, melhores, simples e cristãos. Perdoar setenta vezes sete é possuir em si o dom de perdoar e não de sustentar o erro do outro. Se Deus nos fez conforme Sua imagem e semelhança, devemos ver em nós mesmos seres capazes de caminhar com a cabeça erguida, com respeito e auto-estima.

Direito ao erro todo mundo tem. Direito ao perdão e a uma nova chance todo mundo tem. E todo mundo tem também o direito de dizer não à situações que levam para baixo, às pessoas que, em nome até do amor, tiram sua dignidade.



Temos o direito de errar ao longo da nossa vida. Guiados pelo coração ou emoções que controlam o que nosso juízo deveria controlar, vamos de tropeço em tropeço. Não estamos condenados eternamente porque somos humanos.

O que não podemos, portanto, é repetir vezes e vezes os mesmos erros e achar a cada vez que tudo pode ser justificado. Errar? Pecar? Faz parte, infelizmente, do caminho, da quota de cada um.

Quando cometemos nossos deslizes e que a vida nos dá uma nova oportunidade de recomeçar, é loucura pensar que o perdão nos é devido indefinidamente e querer, de forma absurda, atingir o setenta vezes sete.

Cada pessoa e cada coisa tem seu limite. Repetir erros e enganos contra os que nos amam simplesmente porque sabemos que um coração que ama sabe perdoar, é abusar da confiança que depositam em nós, é desrespeitar o outro como pessoa.

Suportar e suportar erros em nome do amor pode parecer heróico. O perdão é algo que exige de nós uma força quase inhumana e sabemos bem que para realmente perdoar precisamos abandonar o nosso eu que pede justiça.

Mas não temos o direito de brincar com os sentimentos dos outros e nem permitir que brinquem com os nossos. Deslizar e cair uma vez, duas, pode acontecer, mas à partir do momento que isso se torna um hábito é que algo está muito errado.

Devemos aprender a dizer "não" quando isso significa reinvindicar o respeito próprio.

Cada um tem o direito de viver com dignidade e não podemos ser nada para o mundo se já não somos capazes de nos olhar no espelho e sustentar nosso próprio olhar.

Ame o mundo e ame ao outro. E ame-se também, assim como amou e ama Aquele que te criou.

Perdoe e perdoe-se! E não pare no caminho, nem olhe para trás. Há diante de nós um Éden que nos espera e devemos viver de maneira a sermos dignos de passar por essa porta.