sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

AS DEGRADAÇÕES HUMANAS

O cidadão comum, classe média, sai para ir à igreja.
Na esquina perto de sua casa, uma mulher e duas crianças estendem-lhe as mãos e ele finge não ver os pedintes.
Vira à direita, entra numa rua residencial onde garotos se divertem gritando e correndo.
Eles prenderam um gato num cabo de vassoura e esfregam o focinho de um cachorro que late e dá bocadas no bichano que mia desesperado.
O cidadão comum olha indiferente, aliás, todos olham indiferentes e ninguém questiona o significado da cena.
Na próxima rua, o cidadão comum vê uma multidão correndo atrás de um negro querendo linchá-lo porque ele roubou um sanduiche.
O cidadão toma a avenida, avista uma turma de adolescentes zombando de um travesti.
Os transeuntes acham graça e ele também ri.
Segue seu trajeto, encontrando um amigo eufórico e falante que lhe conta com detalhes sobre o gravíssimo acidente que aconteceu há poucos minutos.
O cidadão caminha alguns quarteirões; um cego vem em sua direção pedindo-lhe ajuda para atravessar a rua movimentada e ele diz que não pode ajudá-lo porque está atrasadíssimo para a missa.
Apressa o passo, corre, chega à igreja com a missa começando e entra no templo sagrado para cumprir o seu dever de cristão.

A evolução do mundo não erradicou as injustiças sociais; o computador facilita o cotidiano das pessoas, mas não ajuda a diminui-las, pelo contrário, tornam-se mais intensas e são encaradas como normais.
Formou-se uma consciência ou inconsciência coletiva, de que deve-se excluir aqueles que não preenchem os padrões pré-estabelecidos pelo sistema social.
O cidadão perdeu a capacidade de se indignar, de se comover com os dramas dos seus semelhantes e acostumou-se com tudo.
Seus sentimentos deterioraram-se, degeneraram-se; a máscara da insensibilidade é degradante e esta degradação de sentimentos é a causa maior do aumento da degradação humana.